Há base dupla para o DIFAL na LC 190?

Há base dupla para o DIFAL na LC 190?

Caros membros da Rede Conhecimento Fiscal!

Falar em DIFAL já está cansando. Principalmente, porque não há definição se será cobrado em 2022, se em janeiro ou em abril, ou, se será cobrado …

Essa já é uma dúvida enorme (e sem solução, no momento). Por isso, não precisamos de outras dúvidas para atrapalhar, ainda mais, o nosso trabalho.

Há muitas apresentações sobre a Lei Complementar e “a” DIFAL por aí (“a” porque chamam de “diferença entre as alíquotas”) e tenho observado que são feitas questões sobre a base de cálculo e não são respondidas.

As questões são a respeito do uso da “base dupla”.

Base dupla significa utilizar uma base de cálculo para a aplicação da alíquota interestadual e uma outra base, diferente, para a aplicação da alíquota interna, para obter o valor da diferença entre as alíquotas.

Essa diferença decorre do cálculo “por dentro” do ICMS.

O que se ouve é: “O Convênio ICMS n. 93/2015 estabelecia uma base de cálculo única para o diferencial de alíquotas e a Lei Complementar n. 190/2022 estabelece uma base dupla”.

Isso é verdade? A Lei Complementar n. 190/2022 estabelece base dupla (diferentes) para o cálculo do diferencial de alíquotas?

Resposta: Depende.

De qual diferencial (ou “diferença”) de alíquotas estamos falando?

Regulamentação do diferencial de alíquotas

Nós passamos meses aguardando a publicação da Lei Complementar n. 190 pensando, apenas, no cálculo do diferencial de alíquotas nas operações e prestações interestaduais destinadas a não contribuintes. Mas, a LC 190 trata do cálculo de dois “diferenciais” de alíquotas: operações com não contribuintes e operações com contribuintes (entradas para uso, consumo e ativo imobilizado).

O diferencial de alíquotas nas operações destinadas a não contribuintes, instituído com a Emenda Constitucional n. 87/2015, estava regulamentado pelo Convênio ICMS n. 93/2015 (cujas cláusulas foram declaradas inconstitucionais).

O diferencial de alíquotas que é recolhido pelos contribuintes, nas aquisições e contratações interestaduais não vinculadas a operações subsequentes, não constava na Lei Complementar n. 87/1996 (e estava sendo cobrado pelos Estados há muito tempo). Só era mencionado na substituição tributária do ICMS.

Então, já aproveitaram e trataram dos dois casos:

  1. A diferença entre a alíquota interestadual e a alíquota interna na UF de destino, nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte (aplicável à saída).
  2. A diferença entre a alíquota interestadual e a alíquota interna na UF de destino, nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final contribuinte (aplicável à entrada ou à saída, se houver substituição tributária).

No enunciado da Lei Complementar consta “altera a Lei Complementar n. 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir), para regulamentar a cobrança do Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e sobre Prestações de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS) nas operações e prestações interestaduais destinadas a consumidor final não contribuinte do imposto.”

Não foi citada a cobrança do ICMS nas operações interestaduais com consumidor final contribuinte. Mas, está no texto da Lei Complementar.

Base de cálculo do diferencial de alíquotas

A base de cálculo do ICMS é tratada no Art. 13 da Lei Complementar n. 87/1996.

Está tudo escrito aí. Vamos ver? Só é necessário “decodificar” a informação.

Com a alteração na redação, o texto da Lei Complementar n. 87/1996 ficou assim:

http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/lcp/Lcp87.htm

Art. 13. A base de cálculo do imposto é:

(…)

IX – nas hipóteses dos incisos XIII e XV do caput do art. 12 desta Lei Complementar:   (Redação dada pela Lei Complementar n. 190, de 2022)

a) o valor da operação ou prestação no Estado de origem, para o cálculo do imposto devido a esse Estado;  (Incluída pela Lei Complementar n. 190, de 2022)

b) o valor da operação ou prestação no Estado de destino, para o cálculo do imposto devido a esse Estado;  (Incluída pela Lei Complementar n. 190, de 2022)”

Esclarecimento 1:

É necessário saber o que consta nos incisos XIII e XV do Art. 12.

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

(…)

XIII – da utilização, por contribuinte, de serviço cuja prestação se tenha iniciado em outro Estado e não esteja vinculada a operação ou prestação subsequente.

(…)

XV – da entrada no território do Estado de bem ou mercadoria oriundos de outro Estado adquiridos por contribuinte do imposto e destinados ao seu uso ou consumo ou à integração ao seu ativo imobilizado; (Incluído pela Lei Complementar n. 190, de 2022)”

Então, o inciso IX do Art. 13 está se referindo à base de cálculo do diferencial na operação com contribuinte. Esse é o diferencial que é recolhido na entrada, pelo contribuinte consumidor final. Se a mercadoria estiver sujeita à substituição tributária, o fornecedor fará o cálculo e o recolhimento.

Continuando.

Art. 13. A base de cálculo do imposto é:

(…)

X – nas hipóteses dos incisos XIV e XVI do caput do art. 12 desta Lei Complementar, o valor da operação ou o preço do serviço, para o cálculo do imposto devido ao Estado de origem e ao de destino.  (Incluído pela Lei Complementar n. 190, de 2022)”

Esclarecimento 2:

É necessário saber o que consta nos incisos XIV e XVI do Art. 12.

Art. 12. Considera-se ocorrido o fato gerador do imposto no momento:

(…)

XIV – do início da prestação de serviço de transporte interestadual, nas prestações não vinculadas a operação ou prestação subsequente, cujo tomador não seja contribuinte do imposto domiciliado ou estabelecido no Estado de destino; (Incluído pela Lei Complementar n. 190, de 2022)

(…)

XVI – da saída, de estabelecimento de contribuinte, de bem ou mercadoria destinados a consumidor final não contribuinte do imposto domiciliado ou estabelecido em outro Estado. (Incluído pela Lei Complementar n1 190, de 2022)”

O inciso X do Art. 13 está se referindo à base de cálculo do diferencial nas operações e prestações destinadas a não contribuintes (essa é a parte relativa à EC 87 e ao Convênio ICMS 93/2015).

Continuando.

“Art. 13. A base de cálculo do imposto é:

(…)

§ 1. Integra a base de cálculo do imposto, inclusive nas hipóteses dos incisos V, IX e X do caput deste artigo:  (Redação dada pela Lei Complementar n. 190, de 2022)

I – o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle;

II – o valor correspondente a:

a) seguros, juros e demais importâncias pagas, recebidas ou debitadas, bem como descontos concedidos sob condição;

b) frete, caso o transporte seja efetuado pelo próprio remetente ou por sua conta e ordem e seja cobrado em separado.”

Esclarecimento 3:

Já sabíamos que o ICMS integra a própria base de cálculo, mas, agora foram incluídos, expressamente, os incisos relativos à base de cálculo do diferencial de alíquotas (dos dois).

Continuando.

Art. 13. A base de cálculo do imposto é:

(…)

§ 3º No caso da alínea “b” do inciso IX e do inciso X do caput deste artigo, o imposto a pagar ao Estado de destino será o valor correspondente à diferença entre a alíquota interna do Estado de destino e a interestadual. (Redação dada pela Lei Complementar n. 190, de 2022)”

Esclarecimento 4:

Como já vimos, o inciso IX trata do diferencial na operação com contribuinte e o inciso X, da operação com não contribuinte.

Continuando.

Art. 13. A base de cálculo do imposto é:

(…)

§ 6. Utilizar-se-á, para os efeitos do inciso IX do caput deste artigo: (Incluído pela Lei Complementar n. 190, de 2022)

I – a alíquota prevista para a operação ou prestação interestadual, para estabelecer a base de cálculo da operação ou prestação no Estado de origem; (Incluído pela Lei Complementar n. 190, de 2022)

II – a alíquota prevista para a operação ou prestação interna, para estabelecer a base de cálculo da operação ou prestação no Estado de destino. (Incluído pela Lei Complementar n. 190, de 2022)”

Esclarecimento 5:

Esse § 6. trata da operação com contribuinte (inciso IX). Aqui está a base dupla.

Ao utilizar a alíquota interestadual para estabelecer a base de cálculo no Estado de origem, vamos ter um valor menor que a base de cálculo no Estado de destino, quando será utilizada a alíquota interna.

Fazendo as contas, devemos ter algo assim:

Valor da mercadoria sem ICMS: R$ 880,00

Alíquota interestadual: 12%

Alíquota interna no Estado de destino: 18%

Base de cálculo da operação no Estado de origem:

R$ 880,00 / (1-12%) = R$ 880,00 / 0,88 = R$ 1.000,00

Imposto para o Estado de origem:

R$ 1.000,00 x 12% = R$ 120,00

Base de cálculo da operação no Estado de destino:

R$ 880,00 / (1-18%) = R$ 880,00 / 0,82 = R$ 1.073,17

Cálculo do imposto para o Estado de destino:

R$ 1.073,17 x 18% = R$ 193,17

Diferencial de alíquotas:

R$ 193,17 ? R$ 120,00 = R$ 73,17

Então, não vai funcionar subtrair uma alíquota da outra e aplicar sobre o valor da operação. E esse foi um cálculo “simples”. Não foi considerada a incidência de IPI, que integra a base de cálculo do ICMS quando a mercadoria não é destinada à industrialização ou à comercialização. E, também, não considerei o Fundo de Combate à Pobreza (Art. 82, § 1., do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição Federal).

Continuando.

Art. 13. A base de cálculo do imposto é:

(…)

§ 7. Utilizar-se-á, para os efeitos do inciso X do caput deste artigo, a alíquota prevista para a operação ou prestação interna no Estado de destino para estabelecer a base de cálculo da operação ou prestação. (Incluído pela Lei Complementar n. 190, de 2022)”

Esclarecimento 6:

O § 7., que trata da operação com não contribuinte (inciso X). Aqui não tem base dupla.

É mencionado “a base de cálculo da operação ou prestação”. Não há uma base de cálculo para o Estado de origem e outra base de cálculo para o Estado de destino, como ocorreu no parágrafo anterior.

Assim, fazendo as contas (usando os mesmos valores):

Valor da mercadoria sem ICMS: R$ 880,00

Alíquota interestadual: 12%

Alíquota interna no Estado de destino: 18%

Base de cálculo da operação:

R$ 880,00 / (1-18%) = R$ 880,00 / 0,82 = R$ 1.073,17

É utilizada a alíquota que representa a carga tributária total (alíquota interna no Estado de destino)

Cálculo do imposto para o Estado de origem:

R$ 1.073,17 x 12% = R$ 128,78

Cálculo do imposto para o Estado de destino:

R$ 1.073,17 x 18% = R$ 193,17

Diferencial de alíquotas:

R$ 193,17 – R$ 128,78 = R$ 64,39

Não foi considerada a incidência de IPI, que integra a base de cálculo do ICMS quando a mercadoria não é destinada à industrialização ou à comercialização, e o Fundo de Combate à Pobreza.

Conclusão

Sim, há base dupla para o cálculo da diferença entre as alíquotas interna e interestadual na Lei Complementar n. 190/2022. Mas, é apenas para o cálculo do imposto devido nas aquisições efetuadas por contribuintes. Muitos Estados já adotavam esse cálculo, desde 2016.

Nos Estados que não utilizavam a base dupla, os contribuintes terão um aumento na carga tributária por causa do cálculo por dentro.

Nas operações destinadas a não contribuintes, a base é única. Ou melhor, continua única, como está indicado no § 1. da cláusula segunda do Convênio ICMS n. 236/2021.

Nada mudou. Apenas, o convênio. Entretanto, a carga tributária considerada é a correspondente à alíquota interna na UF de destino. Então, em termos de valores, é a mesma coisa, pois, o fornecedor deve reconhecer, na formação do seu preço, todo o imposto que terá recolher (para a UF de origem e para a UF de destino), caso contrário, vai comprometer a margem na operação.

É importante observar que a legislação dos Estados deverá contemplar esse cálculo.

2 comentários em “Há base dupla para o DIFAL na LC 190?”

    1. Dulcineia L. D. Santos

      Exatamente, Terezinha! E mesmo nas operações com contribuintes, em que o DIFAL (se houver) é cobrado por substituição tributária, é necessário observar a legislação da Unidade da Federação de destino. Em São Paulo, por exemplo, as empresas do Simples Nacional não recolhem o diferencial de alíquotas utilizando a base dupla. Assim, considerando que o DIFAL é o imposto que deveria ser recolhido pelo destinatário, entendo que deve ser utilizada a base de cálculo que o destinatário utilizaria, assim, será aplicada a base única nessa situação. É importante analisar esses “detalhes” da legislação. Agradeço por sua pergunta!

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