Muitos dos problemas que as empresas têm são provocados por atitudes que poderiam ser melhoradas com um pouco de boa vontade. E os “grandes causadores dos problemas” podem não ter conhecimento do mal que causam para a organização.
A seguir, algumas frases que o profissional da Área Fiscal ouve nas empresas quando está tentando observar os procedimentos legais e fazer a coisa certa (e que podem deixar o profissional pensando “o que eu estou fazendo aqui”?) e algumas sugestões para não “deixar a casa cair”.
1) A empresa não pode parar por causa de um papel.
Concordamos, plenamente!
Mas, já foi pensado no que pode acontecer se não for observada a importância desse “papel” no decorrer dos anos?
Ou, no retrabalho ou perda de tempo de profissionais de outros setores para acertar o que poderia ser resolvido de imediato? Ou evitado?
Esse é um discurso muito utilizado por profissionais responsáveis por áreas operacionais (como produção, recebimento, almoxarifado ou manutenção) que querem receber materiais que estão acompanhados por documentos fiscais que apresentam algum tipo de erro. Ou, até, sem documento.
Como evitar que a empresa pare?
Muitas vezes, a solução está em uma boa comunicação.
Um documento fiscal incorreto é resultado de um cadastro incorreto ou incompleto, de uma informação não passada de forma adequada ou de falta de conhecimento sobre a importância do “papel”.
Todos os profissionais da empresa, que estiverem envolvidos com a movimentação de mercadoria, devem saber que a legislação estabelece que deve existir um “papel” acompanhando o processo (mesmo que esse papel não seja físico) e que se o documento não for o adequado, ou estiver incorreto, a empresa poderá ser penalizada por isso e receber uma multa.
Como o órgão mais sensível do ser humano é o bolso, a conscientização pode ajudar.
2) Sempre foi assim.
E é aí que mora o problema.
As coisas mudam. A legislação é alterada. Será que não houve alguma mudança na legislação que afetou o processo?
É bom não “chutar o balde” e dizer logo que “então, sempre esteve errado” porque pode magoar o colega e piorar a situação.
Mas, sem dúvida, essa é uma possibilidade.
Quando um procedimento é adotado por um longo período de tempo, sem que seja observada a sua conformidade com a legislação, a empresa pode estar em uma situação de risco de autuação fiscal. Como resolver?
É necessário fazer uma revisão periódica nos processos. Inclusive, naqueles textos que são impressos nos documentos fiscais e que não costumamos nem ler.
Sempre que houver mudança na legislação, é obrigatório fazer um levantamento dos documentos, operações e processos em que a norma é utilizada e atualizar as informações.
A falta de tempo, muitas vezes, faz com que a verificação seja postergada e … acabe não sendo feita.
E é assim que se descobre depois de anos que um dispositivo legal citado em um documento já foi revogado.
Quando é um funcionário da empresa que observa o fato, é bom.
Pior é quando a descoberta é feita pela fiscalização. Nessa hora, o tempo não utilizado para aquela revisão periódica vai fazer muita falta.
3) Minha função é vender.
Essa frase é clássica!
Mas, não é bem assim, caro colega.
E há colegas da Área Comercial que utilizam argumentos mais (digamos) persuasivos: “Se eu não vender, não pagam o seu salário!”.
Nessa situação, é bom contar até dez para não partir para a agressão.
Em uma organização, é normal cada colaborador ter uma função definida. Entretanto, todos atuam na mesma empresa. Não é assim?
Portanto, não tem sentido alguém acreditar que só há importância em sua nobre função e não ter preocupação com os reflexos de seus atos em outros setores.
Há profissionais de vendas que acreditam que o negócio deve ser feito a qualquer custo e procuram “dar um jeito” para a Nota Fiscal sair da forma que o cliente pediu, mesmo que isso não esteja de acordo com o que é estabelecido na legislação.
Como não comprometer a comissão do colega e não precisar rezar para passar cinco anos logo?
Mais uma vez é necessário ter uma boa comunicação. Um treinamento (que pode ser desenvolvido e apresentado por profissionais da própria empresa) pode ajudar bastante.
E deve ser “sensibilizada” toda a hierarquia. É comum que as ordens venham “de cima” (gerente ou diretor) e contamine todo departamento.
Nessa situação, é bom separar aqueles artigos da legislação onde estão relacionados os valores das multas e fazer uma apresentação relacionando os problemas causados pelo colega (ou colegas) e os valores que a empresa vai perder com uma autuação fiscal (e quanto que isso pode representar no resultado da empresa).
E se houver matérias de jornal com casos de empresas que foram surpreendidas pela fiscalização em situações de irregularidade parecidas, é melhor ainda.
Esse “choque de realidade” costuma funcionar.
4) Minha função é comprar com o melhor preço.
Essa é uma variação do “minha função é vender”.
E a solução dos problemas provocados por essa “boa compra” sobram para quem? Provavelmente, para os profissionais de outros setores.
No interesse de economizar na negociação, muitos compradores não observam a condição do fornecimento, tributos incidentes na operação, informações que devem ser prestadas e a qualidade dos documentos emitidos pelo fornecedor. Como evitar ter que “pagar o pato” pela economia do comprador?
Aquele treinamento apresentado para o vendedor pode ser adaptado para o comprador (e chefia).
No caso do comprador, o ótimo negócio pode ter custos embutidos e que ele não percebe.
Um exemplo é o diferencial de alíquotas do ICMS que pode ser devido nas compras interestaduais. Esse é um valor que deve ser contabilizado na mesma conta do material (e no mesmo Centro de Custo) para que a área que requisitou o material tenha conhecimento do valor total. Como o diferencial é apurado na escrituração, há empresas que contabilizam o diferencial na conta de tributos e esse custo adicional da compra desaparece.
Um comprador deve saber a importância da classificação fiscal de uma mercadoria, ter uma ideia dos tributos que incidem em uma operação e dos cuidados que deve tomar ao fazer uma negociação de compra.
Considerando que os sistemas estão cada vez mais integrados e que as informações dos materiais estão nos cadastros, é possível ter uma simulação dos valores para uma melhor análise da compra. E aquela “tabela de multas” também deve ser apresentada ao comprador, relacionando as situações relevantes.
5) Todo mundo está fazendo isso.
Verdade? Então, todos serão autuados juntos. Ao menos, poderão fazer uma defesa conjunta e solicitar um desconto no custo da ação para o advogado.
Esse argumento é comum na Área Comercial, mas pode ser utilizado por outros profissionais, também. E aí, o que fazer para não integrar a ação conjunta?
Mais uma vez, aquele levantamento dos artigos da legislação com os valores das multas será útil.
Relacionar os procedimentos “que todo mundo está fazendo” e a penalidade aplicável (e fazer uma projeção para 5 anos, que é o tempo que o Fisco tem para vir na empresa) e apresentar ao responsável por autorizar o pagamento para que ele decida se vale a pena correr o risco.
É claro que é importante indicar uma alternativa ao procedimento inadequado e esclarecer qual seria a melhor forma de proceder naquela situação.
E todos viverão felizes para sempre!
6) É amigo do dono. É amigo do diretor. A empresa é do mesmo grupo.
Sim, e daí?
A fiscalização vai considerar essa relação de amizade antes de apresentar o auto de infração?
Essa é uma situação muito complicada porque quem deveria auxiliar na solução dos problemas é quem está causando o problema. Como evitar um auto de infração sem perder o emprego?
Aquela “tabela de multas” pode ajudar.
O profissional da Área Fiscal precisa comunicar ao gestor os riscos que a operação ou procedimento apresentam.
É comum a justificativa de que “sempre foi feito assim” e nunca pegaram. Nesse caso, é bom lembrar ao interlocutor que hoje existe um tal de SPED que tem ajudado a fiscalização a detectar as irregularidades mais fácil e rapidamente.
Se, mesmo assim, for determinado que a operação ou procedimento sejam mantidos, não há mais o que ser feito.
Mas, é importante manter a documentação que comprove que houve a comunicação ao gestor (e rezar para quem passem os 5 anos logo).
E avaliar se vale a pena permanecer nessa organização.
E aí? O que você achou de tudo isso que foi comentado aqui?
Em algum momento teve a impressão de já ter visto esse filme?
Caso tenha identificado procedimentos praticados por sua empresa, não se desespere! Tudo o que foi citado foi constatado em inúmeras empresas. “Todo mundo está fazendo isso …”.
É bom conversar com sua equipe de trabalho, ou com os colegas dos outros setores, e verificar o que pode ser melhorado. Nunca é tarde para começar.