Estamos aguardando a publicação da Lei Complementar que vai instituir o IBS e a CBS.
A Emenda Constitucional nº 132/2024 nos trouxe as disposições gerais sobre os tributos que serão instituídos com a Reforma Tributária, mas há muito a ser definido e, eu arriscaria dizer, confirmado, com a Lei Complementar.
Antes da publicação da Lei Complementar, só podemos praticar o “achismo” sobre a forma de cálculo durante a transição, a forma de crédito e o cumprimento de obrigações acessórias. Há um direcionamento no texto da EC 132/2023, mas faltam detalhes que só regulamentação trará.
Entretanto, há um ponto que a EC 132/2023 não tratou: a formação das bases de cálculo do ICMS e do ISS durante a transição.
E isso nos leva a uma questão: Será que o IBS e a CBS vão integrar as bases de cálculo do ICMS e do ISS durante a transição?
O Art. 133 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, incluído pela Emenda Constitucional nº 132/2023, dispõe que:
“Art. 133.Os tributos de que tratam os arts. 153, IV, 155, II, 156, III, e 195, I, “b”, e IV, e a contribuição para o Programa de Integração Social a que se refere o art. 239 não integrarão a base de cálculo do imposto de que trata o art. 156-A e da contribuição de que trata o art. 195, V, todos da Constituição Federal.”
O que isso significa? Significa que o IPI, o ICMS, o ISS, o PIS e a COFINS não integrarão a base de cálculo do IBS e da CBS.
O IS, Imposto Seletivo, quando existir, integrará as bases de cálculo do IBS e da CBS (e do ICMS e do ISS, durante a transição), conforme estabelece o § 6º do Art. 153 da Constituição Federal/1988, na redação trazida pela EC 132/2023.
“Art. 153. Compete à União instituir impostos sobre:
(…)
VIII – produção, extração, comercialização ou importação de bens e serviços prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, nos termos de lei complementar.
(…)
§ 6º O imposto previsto no inciso VIII do caput deste artigo:
(…)
III – não integrará sua própria base de cálculo;
IV – integrará a base de cálculo dos tributos previstos nos arts. 155, II, 156, III, 156-A e 195, V;
(…)”
O IS não vai integrar as bases do PIS e da COFINS porque passará a ser cobrado em 2027, quando as contribuições serão extintas (Art. 126 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias).
A nossa questão diz respeito à composição das bases de cálculo do ICMS e do ISS durante o período de transição, quando haverá a cobrança simultânea com o IBS e a CBS.
O IBS e a CBS integrarão as bases de cálculo do ICMS e do ISS? A EC 132/2023 é omissa em relação a isso. Não menciona que irá integrar, como ocorreu com o Imposto Seletivo, e não menciona que não vai integrar.
O inciso IX do § 1º, do Art.156-A da CF/1988, que trata da instituição do IBS, apresenta o seguinte texto:
“Art. 156-A. Lei complementar instituirá imposto sobre bens e serviços de competência compartilhada entre Estados, Distrito Federal e Municípios.
(…)
§ 1º O imposto previsto no caput será informado pelo princípio da neutralidade e atenderá ao seguinte:
(…)
IX – não integrará sua própria base de cálculo nem a dos tributos previstos nos arts. 153, VIII, e 195, I, “b”, IV e V, e da contribuição para o Programa de Integração Social de que trata o art. 239;
(…)”
Está indicado que o IBS não integrará a base de cálculo do IS (Art. 153, VIII), da CBS (Art. 195, V) e das contribuições do PIS e da COFINS (demais incisos do Art. 195 e o Art. 239). Onde estão o Art. 155, II (ICMS) e o Art. 156, III (ISS)? Não estão.
Poderíamos pensar que essa “ausência” decorre do fato de que o IBS irá substituir o ICMS e o ISS. Mas, haverá um período de transição de 4 anos (sem considerar o período experimental de 2026 a 2028) em que os 3 impostos vão coexistir. Assim, será necessário considerar o efeito do IBS nos cálculos do ICMS e do ISS.
O § 17 do Art. 195 da CF/1988, que trata da CBS, apresenta o seguinte texto:
“Art. 195. A seguridade social será financiada por toda a sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, e das seguintes contribuições sociais:
(…)
V – sobre bens e serviços, nos termos de lei complementar.
(…)
§ 17. A contribuição prevista no inciso V do caput não integrará sua própria base de cálculo nem a dos tributos previstos nos arts. 153, VIII, 156-A e 195, I, “b”, e IV, e da
contribuição para o Programa de Integração Social de que trata o art. 239.
(…)”
Nesse dispositivo foi prevista a não inclusão da CBS nas bases de cálculo do IS (Art. 153, VIII), do IBS (Art. 156-A) e das contribuições para o PIS e a COFINS (artigos 195, I, “b”, e IV e 239). E, mais uma vez, o ICMS (Art. 155, II) e o ISS (Art. 156, III) não estão mencionados.
No primeiro momento, pensei que havia “deixado escapar” alguma coisa. Consultei algumas pessoas, para verificar se a minha interpretação estava correta, e recebi a confirmação desse entendimento. Entre essas pessoas, está o tributarista Miguel Silva, que participou da 12ª Semana Paulista da Contabilidade, que foi promovida pelo Sindicato dos Contabilistas de São Paulo e cujo tema foi a Reforma Tributária.
Então, será que a não indicação sobre a composição das bases de cálculo do ICMS e do ISS, durante o período de transição, foi proposital para deixar que a Lei Complementar traga essa definição?
E se a Lei Complementar dispuser que o IBS e a CBS vão integrar as bases de cálculo do ICMS e do ISS?
Muitos poderão alegar que o próprio ICMS, o PIS e a COFINS integram a base de cálculo do ICMS e o valor da operação com mercadorias. E que o próprio ISS, o PIS e a COFINS integram a base de cálculo do ISS e o valor dos serviços. Assim, não haveria problema algum manter o IBS e a CBS nas bases de cálculo.
OK. Mas, o ICMS, o ISS, o PIS e a COFINS não são cobrados na forma de “IVA”.
Ainda temos o IPI, que também não é mencionado como será a composição da base de cálculo (Art. 153, IV). Apenas sabemos que não haverá a incidência conjunta com o IS.
Alguém pode perguntar: O IPI não terá a alíquota reduzida a zero?
Sim, terá, apenas para os produtos que não tenham industrialização incentivada na Zona Franca de Manaus. Por isso, é possível que exista produto com tributação pelo IPI por muito tempo, ainda.
Assim, imaginem a situação em uma operação com mercadoria destinada ao uso ou consumo durante o período de transição (e que tenha IPI):
– O IBS e a CBS entram na base de cálculo do IPI.
– O IBS e a CBS entram na base de cálculo do ICMS.
– O IPI entra na base de cálculo do ICMS.
– O ICMS entra na própria base de cálculo.
E tudo isso deve ser considerado na formação do preço.
E ainda poderemos ter operações com IS, em que ocorrerá o seguinte:
– O IS entra na base de cálculo do IBS e da CBS.
– O IS entra na base de cálculo do ICMS.
– O IBS e a CBS entram na base de cálculo do ICMS.
– O ICMS entra na própria base de cálculo.
E tudo isso entra na formação do preço.
E o cálculo do IBS e da CBS será feito “por fora” do preço. Ao menos, é assim que funciona um IVA.
É claro que tudo isso foi um grande exercício de “achismo“. A Lei Complementar vai trazer a regulamentação e a definição de como deverão ser feitos os cálculos.
Agora, voltando à nossa questão inicial: “Será que o IBS e a CBS vão integrar as bases de cálculo do ICMS e do ISS durante a transição?”
Entendo que não seria adequado por duas razões:
1) Vai conflitar com o conceito de “IVA” que esses tributos têm.
2) Os contribuintes não merecem isso, não é?
Assim, esperamos que os redatores do projeto da Lei Complementar que vai instituir o IBS e a CBS, e os membros do Congresso Nacional, eliminem a omissão da Emenda Constitucional no sentido de não incluir o IBS e a CBS nas bases de cálculo do ICMS e do ISS, enquanto eles existirem.
Seguimos acompanhando.